Em minha mente
circundam, intrometidas, mil histórias de amor, cada qual com seu e
sua protagonista e uma pontada de romantismo que além de servir como
tempero e jogo de marketing, traz velhas lembranças às vovós
fazedoras de crochê. Vovós que acima de todas as crises de
Alzheimer, conseguem reviver dentro de si os amores que a modernidade
tanto tenta copiar: as percas das guerras, as dificuldades dos
sobrenomes rivais, as dimensões do campo e da cidade, o absurdo da
diferença de classes e cores, e tantos outros enredos que vemos na
sessão “romance” e “comédia romântica” das locadoras.
Hoje, cada ruga marcada
pelo tempo, é em seus rostos, uma prova viva de uma história de
amor vista, degustada, tocada e, no geral, sentida. Quem dera nós,
pequenos cientistas do futuro, ter vivido apenas uma das histórias
de amor sentida por essas idosas muitas vezes ranzinzas e outras
vezes dóceis. Não me refiro ao sonho de ter aquele homem de sorriso
angelical, olhos encantadores, voz suave e um cabelo incrivelmente
cheiroso que faz tremer nossas pernas apenas com sua presença a meio
metro de nossos corações. Me refiro ao sonho de ter alguém, que
com seu particular encanto, ri de você com um pedaço de alface
preso nos dentes, alguém que reclama do seu jeito de apertar o creme
dental, alguém que com você disputa o controle remoto, alguém que
diz que seu gosto musical é assustador, alguém que ache que
dadaísmo não é arte, mas alguém que acima de todas as
brincadeiras que machucam, todas as vergonhas que te faz passar,
todos os xingamentos e palavrões inventados, tem o dom de te
respeitar, de te acolher e de ser o único a quem você pode chamar
de “meu amigo, meu amor”.
É com orgulho e com
uma boa refeição de ego que posso dizer que vivo uma antiga
história de amor nos tempos modernos. É com o mais espontâneo dos
sorrisos que grito aos quatro ventos o quanto, ao fechar os olhos e
mergulhar nas lembranças, minha vida parece um filme ganhador de
Óscar por ter alguém que me faz sentir todas as mais variadas
histórias de amor em apenas um segundo.
O título ainda não
foi definido, mas os atores doam diariamente suas vidas por essa
obra, já sabendo que no final, diante de tantas plásticas faciais,
seremos eu e ela as únicas com penetrantes rugas no rosto, sentadas
em uma cadeira de balanço fazendo crochê.
28 de Outubro de 2012