domingo, 28 de outubro de 2012

Textículo de Verão


      Em minha mente circundam, intrometidas, mil histórias de amor, cada qual com seu e sua protagonista e uma pontada de romantismo que além de servir como tempero e jogo de marketing, traz velhas lembranças às vovós fazedoras de crochê. Vovós que acima de todas as crises de Alzheimer, conseguem reviver dentro de si os amores que a modernidade tanto tenta copiar: as percas das guerras, as dificuldades dos sobrenomes rivais, as dimensões do campo e da cidade, o absurdo da diferença de classes e cores, e tantos outros enredos que vemos na sessão “romance” e “comédia romântica” das locadoras.
        Hoje, cada ruga marcada pelo tempo, é em seus rostos, uma prova viva de uma história de amor vista, degustada, tocada e, no geral, sentida. Quem dera nós, pequenos cientistas do futuro, ter vivido apenas uma das histórias de amor sentida por essas idosas muitas vezes ranzinzas e outras vezes dóceis. Não me refiro ao sonho de ter aquele homem de sorriso angelical, olhos encantadores, voz suave e um cabelo incrivelmente cheiroso que faz tremer nossas pernas apenas com sua presença a meio metro de nossos corações. Me refiro ao sonho de ter alguém, que com seu particular encanto, ri de você com um pedaço de alface preso nos dentes, alguém que reclama do seu jeito de apertar o creme dental, alguém que com você disputa o controle remoto, alguém que diz que seu gosto musical é assustador, alguém que ache que dadaísmo não é arte, mas alguém que acima de todas as brincadeiras que machucam, todas as vergonhas que te faz passar, todos os xingamentos e palavrões inventados, tem o dom de te respeitar, de te acolher e de ser o único a quem você pode chamar de “meu amigo, meu amor”.
É com orgulho e com uma boa refeição de ego que posso dizer que vivo uma antiga história de amor nos tempos modernos. É com o mais espontâneo dos sorrisos que grito aos quatro ventos o quanto, ao fechar os olhos e mergulhar nas lembranças, minha vida parece um filme ganhador de Óscar por ter alguém que me faz sentir todas as mais variadas histórias de amor em apenas um segundo.
        O título ainda não foi definido, mas os atores doam diariamente suas vidas por essa obra, já sabendo que no final, diante de tantas plásticas faciais, seremos eu e ela as únicas com penetrantes rugas no rosto, sentadas em uma cadeira de balanço fazendo crochê.  

28 de Outubro de 2012

domingo, 6 de maio de 2012

Marinheiro

     Observo o crepúsculo esperando uma Lua que não há de vir, mas é apenas por ora. A Crescente se iniciará e nossa arte dançará iluminando cada vez mais as estrelas e entoando a orquestra de um mantra apaixonado. O horizonte intriga a forma do tão disforme planeta. Balançando, balançando. Piso na madeira que geme como um cão velho. Gostaria de cantar, abrir a boca e soltar um grito que percorreria todos os 7 mares em uma vibração única que faria com que todas as criaturas oceânicas saltassem para a superfície em um voo calculado em direção à quase-Lua. Balançando, balançando. E vou, vou entoar os mais belos cânticos ao mar para quem sabe pelas ondas te encontrar. Fecho os olhos e lembro-me da falsa lembrança que tenho de seus cabelos molhados escorrendo pelas tuas costas esculturais de pele macia, tão macia. A água [balançando, balançando] caminhando suavemente por teu rosto enquanto luta contra a gravidade desenhando seus lábios grossos, mais macios ainda. Beije o mar, para se encontrar em mim. Mas se não encontrar, vou deixar uma bandeira a deriva, encontre-a e a brisa me levará de volta para você. 

24.04.12 e 07.05.12

Tempo Meu


Preciso fechar os olhos
Necessito encontrar a definição exata desse eu que não sou
Careço de informações absolutas de mim
Preciso de teus lábios carmim

Necessito, talvez, de bocas disformes
Careço, quem sabe, de salivas quentes
Preciso, talvez, naufragar em teu fogo
Necessito, quem sabe, entrar no seu jogo

Careço sem o porém do após
Preciso da insensatez dos nós
Necessito da mutabilidade dos três
Careço de seu sorriso cortês

Preciso agora do depois
Necessito sem hora de nós dois
Careço daquele incrível clichê
[onde]
Preciso da imprecisa você

06.05.2012

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Fevereiro

Em lua cheia, o mês de ar se revela
Brinca com nossas sensações
Dança contíguo à ironia

Sento-me em frente à janela
Observo ilustrações
Suavemente pervertidas, sem euforia

                                                      Vejo.
                                                                                           Sinto.
                                                                          Beijo.
                                            Nela.
                                                             Perco.
                                                                                                                  Acho.
                                                                                    Seja.
                                                               Ela.

Abraço tua cintura
Entrelaço minhas mãos, cada uma se coadjuva
Estamos [rodeadas] em apogeus

O tempo e sua loucura
Fazendo com que mesmo em dias de chuva
Meu refúgio seja céu dos olhos teus.

13 fev. 2012